O nosso santo churrasco de cada dia

István Wessel | Foto: divulgação

Por István Wessel

Acredite se quiser, mas churrasco é o grande prato nacional do Brasil. Deve ser o único a ser servido nos mais de cinco mil municípios brasileiros todos santo domingo (quando não nos outros seis dias). Primeiro, porque a carne brasileira está muito boa. Sim, está, pois nem sempre esteve. Essa melhoria em toda a cadeia da carne melhorou demais nos últimos 20 anos. Se hoje a idade média de abate mal passa de dois anos, durante muitas décadas foi de cinco. A diferença? Maciez e sabor, que é tudo que a gente espera de um bom churrasco.

Claro que os cortes também evoluíram. Para se ter uma ideia, a picanha, hoje símbolo do churrasco brasileiro, não tem 40 anos. Meu pai começou a cortá-lo quando chegamos ao Brasil em 1957 para atender a clientela de alemães e austríacos que tem na picanha (tafelspitz em alemão) uma de suas iguarias. Não, não é para churrasco e sim para cozido. Imaginem! Imaginem se alguém ousar colocar uma picanha na panela aqui entre nós. Dá briga!

 

Vamos lembrar que nos anos 50/60 churrasco em São Paulo era uma fatia fina de carne que ficava de um dia para o outro no vinagrete para amaciar. No dia seguinte era grelhado para ser servido no pãozinho com a vinagrete do tempero. Depois, na mesma São Paulo, havia as churrascarias do Centro (Av. Rio Branco), a Cabana e a Guacyara, onde o “chique” era pedir o Xixo misto que era um espeto, espetado no centro da mesa, com um pedaço de lombo, outro de linguiça e ainda um pedaço de Filé Mignon. Pode acreditar!

Que evolução, heim? O que pretendo apresentar no Nordeste Bahia Gourmet são cortes de carne, a melhor forma de servir e principalmente mostrar a questão do ponto da carne, que é o assunto que mais suscita divergências entre garçons e clientes nos restaurantes.

Vamos acabar com essa briga juntos?

Mestre da carne, István Wessel, está à frente da Wessel Culinária & Carnes. A família Wessel completa, em 2010, cinquenta e dois anos de Brasil. Além de trazer os melhores cortes de carne e produtos até então pouco conhecidos pelos brasileiros, em 1967 os Wessel introduziram a técnica da carne maturada, decretando, assim, o fim da carne dura. O carpaccio foi outra novidade oferecida pela Wessel aos seus clientes (em 1980), que em pouco tempo conquistou apreciadores fiéis. O chef dará dicas para um bom churrasco amanhã, 20 de novembro, às 18h, no Nordeste Bahia Gourmet.

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Cozinha que desaparece

Chef Guilherme Radel | Foto: divulgação

Por Guilherme Radel

Tenho grande preocupação com a sobrevivência da cozinha afrobaiana. Há elencados no meu livro A Cozinha Africana da Bahia 38 pratos que nasceram das mãos da mucama adaptando-os do cardápio português. Desses pratos elencados, alguns já não comparecem à mesa do baiano e suas receitas foram resgatadas em minha obra. Em realidade, hoje, são servidos de modo corrente aos comensais apenas o vatapá, o caruru, o acarajé e o abará.

O ochin-chim de galinha, o efó, o humulucu e o arroz de hauçá aparecem de modo esporádico. O amalá, o latipá, o lelé, o afurá, o quibombo, o ecuru, o quitandê, o efun-oguedê, o denguê, o ipetê, o erampaterê desapareceram da dieta dos baianos. Alguns desses pratos sumidos da mesa dos baianos, são servidos aos Orixás. O amalá é servido a Obá e Iansã, o denguê, a Iansã, o ipetê, a Oxum, o latipá, a Omulu. Isto pode ser uma garantia de que eles não desaparecerão. O arroz de hauçá, talvez por ter origem numa tribo muçulmana da Nigéria e ter duas coisas que só são usadas nele e no ecuru: o charque e a fritura, não é ofertado aos Orixás.

O charque lembra a escravidão, sendo uma quizila. O amalá, por ter os ingredientes que os africanos trouxeram para o Brasil, o quiabo, o inhame e o azeite de dendê, é um prato síntese da cozinha afrobaiana, servida ao Orixá Obá, e seria ótimo que ele voltasse à mesa dos baianos. É um prato simples, mas de grande sabor.

Professor emérito da UFBA, Guilherme Radel é estudioso de gastronomia e autor de quatro livros sobre a cozinha baiana. O último, A Cozinha Africana da Bahia, é resultado de dez anos de pesquisa. Radel ministrará a aula “Tem prato que está sumindo!” no sábado, 20 de novembro, às 14h, no Nordeste Bahia Gourmet.

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O fazer da hora

Por Ana Soares

Chef Ana Soares | Crédito: Patricia Araujo/Folhapres

Graciosa como o quê, a cozinha trivial brasileira, ou a cozinha do dia a dia, por incrível que pareça, tem unanimidade nacional no que tange ao improviso, à criatividade, ao uso da horta ou do pomar, do quintal, atravessa a sala e se instala na varanda, “botecos” de rua simples, acolhedores com a personalidade da família, fazendo e servindo à moda da casa.

Cozinha favorita, a “baixa gastronomia” é perfumosa, saborosa, preciosa e simples. Tem suas técnicas nos jeitos de ser e fazer e preservar, usa e abusa dos costumes locais e irreverente com a tradição e o sabor, evolui para o futuro ousando por cima das carências e intempéries.

Um fazer da hora, do minuto, abafado, refogado, chiado, chamuscado, bendito seja o pão nosso de cada dia, picadinho.

No hino nacional nosso arroz com feijão… E se tiver na cozinha um pastelzinho ou mandioca frita, então…

Eu sou de Guararapes, perto de Araçatuba, interior de São Paulo na direção do Mato Grosso. Meu pai me ensinou a comer de tudo, nas nossas viagens de trem, de jeep, de trator, de avião, no lombo do burro, de barco por esse mundão de Brasil afora.

Nascida em Guararapes, interior de São Paulo, em uma família de mulheres que eram exímias cozinheiras, Ana Soares se formou em arquitetura e demorou um pouco para se dedicar à gastronomia. Precisou morar em Paris para que a culinária realmente a conquistasse. À frente do Mesa III Gastronomia, assina o menu de diversos restaurantes, bares e cafés de São Paulo. No Nordeste Bahia Gourmet, Ana Soares apresentará o workshop “Massas Reachadas, no dia 19 de novembro, às 19h30, e a aula “Receitas testadas e aprovadas de buteco”, no dia 20 de novembro, às 16h.

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Bolo de rolo… Não parece nem de longe com rocambole

Tânia Bastos | Divulgação

Por Tânia Bastos

Delicado, delicioso, o bolo de rolo virou uma marca registrada de Pernambuco.

O Bolo de Rolo, a partir de adaptação do “colchão de noiva” português – substituindo na receita seu recheio de amêndoas pelo de goiaba. E passou-se a enrolar esse bolo em camadas cada vez mais finas, como um rolo. O nome vem daí.  Ele é copiado também em outros estados. Mas em Pernambuco é diferente, pela maneira de fazer, sobretudo pela delicadeza no jeito de enrolar as camadas. Passando a ser cada vez mais conhecido e divulgado, o bolo de rolo ganhou fama. Quanto mais fininha é a espessura da massa, mas gostoso é o bolo de rolo e mais habilidosa é a doceira. O segredo está no jeito de preparar.

A palavra rocambole viria do personagem homônimo criado pelo escritor francês Pierre Alexis, visconde de Ponson du Terrail (1829-1871), autor de folhetins populares. Era audaz, aventuroso e, tão ””enrolado”” que acabou virando bolo. Mas só no sul do Brasil, é bom lembrar; que, como em outros cantos, receitas similares recebem nomes diferentes. Na França, por exemplo, mais conhecidas são “roulé aux dattes” (massa seca e fina com recheio de tâmaras) ou “bras de Vénus”(pão de ló com creme de funcho); na Alemanha, “strudel” (massa filo com recheio de maçãs, passas e canela); na Hungria, “retes”. Todas, herança do “baklava” turco (massa folhada recheada com amêndoas ou nozes).

Em Portugal e demais países de língua portuguesa, esse tipo de bolo mais comumente recebe o nome de “torta” – com destaque, entre elas, para as “de laranja”, “de segredos” e “de claras”. Mais provável é que as damas portuguesas vindas para o Brasil na comitiva de Dom João VI sentiram, naqueles primeiros tempos, enormes dificuldades para executar algumas de suas receitas – dado não terem, à mão, o que usavam na Europa distante: amêndoa e pinhão; maçã, marmelo e pêra; canela, cravo e gengibre.

Passaram então a experimentar ingredientes dessa terra, para elas nova, modificando boa parte de suas receitas originais. Assim, provavelmente, nasceu nosso bolo de rolo, uma adaptação do colchão de noiva português. Até porque, fosse inspirado no rocambole, e teria inevitavelmente usado a receita do pão de ló, chegado ao Brasil nos primórdios do séc. XVII – e reproduzido, até hoje, sem nenhuma variação.

De resto, nosso bolo de rolo já se fazia, por aqui, bem antes de nossa cultura sofrer as interferências do francesismo. É que, nesse tempo, “as tradições portuguesas de bolo e de doce tinham se instalado tão bem nos fornos das casas-grandes de engenho e de alguns conventos de freiras, que a influência francesa só as atingiria de maneira mais viva no século XIX, quando os confeiteiros franceses começaram a se tornar chiques na Corte e no Recife”, ensina Gilberto Freyre (em “Açúcar”). Alguns até podem ser rocambole, vá lá. Mas bolo de rolo não. Bolo de rolo é bolo de rolo só, e ponto final.

O bolo mais famoso de Pernambuco foi consagrado como um patrimônio cultural e imaterial do estado. Uma delícia que passa de mesa em mesa há mais de 300 anos. São receitas protegidas, conservadas e valorizadas por sua importância histórica, cultural e gastronômica para o País.

Baiana de Recife, como gosta de ser chamada, a chef pâtissier Tânia Bastos iniciou a carreira gastronômica  aos 12 anos, ajudando na cozinha de casa. No início utilizava um pequeno caderno de receitas de sua mãe. Mais tarde começou a fazer preparações próprias mais elaboradas e hoje é também gastrônoma, especialista em Gestão de Qualidade e Segurança de Alimentos. Tânia Bastos apresentará no Nordeste Bahia Gourmet o workshop “Bolo de Rolo”, dia 18 de novembro, às 13h30.

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“Naquela mesa está faltando ele”

Por Mabel Velloso

Mabel Velloso | Crédito: Divulgação

A palavra gastronomia não era conhecida lá em casa. A arte da gastronomia estava em cada um de nós e não sabíamos. A mesa farta, o cheiro da cozinha invadindo a sala, as cores do arco-íris espalhadas nos pratos, os melhores sabores derramados em nossas bocas – tudo estava lá. Conhecíamos bem, tudo era muito íntimo de cada um de nós, a palavra é que não se falava, desconhecida daquela gente simples que vivia intensamente, arrodeando a mesa, sem lembrar o pecado da gula.

Hoje ouço muito dizer que minha mãe pode ser professora de gastronomia! Dizem que nossa mesa é catálogo de gastronomia! Acho graça das falas e continuo vendo os pratos cheios de saber e sabor e agradeço a Deus o tempo que estamos vivendo, agradeço o aprender de cada dia, as palavras bonitas que são títulos de livros e receitas, e até nos fazem chefes de cozinhas.

Antigamente aprendia-se a cozinhar olhando os mais velhos cozinharem. Seguia-se o refrão: “Quanto mais a gente ensina mais aprende o que ensinou…”  As aulas eram sem fim, o aprendizado contínuo, a alquimia dos temperos temperando nossa casa, temperando tantas vidas.

Hoje, nas horas das refeições, uma canção sempre toca meu coração. Parece que, além do tic-tac, do meu peito sai num acorde de saudade: “Naquele mesa está faltando ele , e a saudade dele está doendo em mim.”  Na cabeceira da mesa, minha mãe e em volta meus irmãos, minhas filhas, meus netos, meus sobrinhos, meus amigos não escutam a “canção que me invade”. Por mais saboroso que esteja o prato, por mais doce que esteja a sobremesa, pensando em meu pai, um amargo lembrar tira meu apetite.

Escritora, compositora e professora, Mabel Velloso é baiana de Santo Amaro da Purificação. É irmã dos ícones da MPB Caetano Veloso e Maria Bethânia. Apresenta uma coletânia de mais de dez livros e mais de seis composições gravadas na MPB. Mabel apresentará no Nordeste Bahia Gourmet o  workshop “Receitas de Família”, dia 19 de novembro, às 13h30.

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Ingrediente Nordestino, cozinha global

Por Edinho Engel


Chef Edinho Engel | Foto: Divulgação

Que a Bahia é um lugar belíssimo, isso é indiscutível. O sol é intenso e aquece a alma. O mar que cerca o estado é de um azul incomparável. Seu povo é alegre, caloroso e como sabe fazer uma festa! Mas a Bahia não é apenas um exuberante cenário paradisíaco; sua gastronomia rica e colorida é de deixar qualquer chef cheio de orgulho.

Ingredientes e pratos encontrados aqui, como nossa farinha, frutas locais, moquecas e vatapás são de grande qualidade e oferecem uma oportunidade infinita de criações gastronômicas. Entretanto, a maior parte das pessoas que acredita nisso não é baiana. Muitas vezes nem mesmo brasileira!

É aquela história, “Santo de casa não faz milagre”. Por isso tornou-se tendência na gastronomia mundial tentar acabar com esse preconceito de que o que a gente faz em casa não é tão bom quanto o que a gente encontra fora.

Vamos ensinar o nosso povo a valorizar os ingredientes que só a Bahia e o Nordeste

Caruru | Foto: divulgação


têm fazendo receitas inesquecíveis para o paladar. Basta usar a competência e a criatividade para, a partir desses produtos locais, criar uma cozinha global, sem fronteiras, mas intimamente nossa. Isso já foi feito em Pernambuco. No Peru também com um resultado extremamente positivo para o setor de turismo.

Está na hora de descobrir o melhor vatapá, o melhor bolo de rolo, o melhor produtor de biribiri. Um bom chef precisa de bons ingredientes e os nossos fornecedores precisam saber disso. Vamos discutir a valorização dos produtos de casa e fazer com que os baianos percebam a importância e a magnitude da gastronomia local.

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Olá!

Bem vindos ao blog do Nordeste Gourmet! Divirta-se com este espaço exclusivo onde os grandes chefs do Nordeste Bahia Gourmet 2010 publicarão artigos e dicas sobre a deliciosa arte da culinária. O antigo blog do Bahia Gourmet 2008 não será desativado. Antigos – e novos – leitores ainda podem ler as matérias e artigos publicados na última edição do evento. É só clicar no link > http://bahiagourmet.blogspot.com/

Se você ama a gastronomia, esse blog é o seu lugar. Pode ficar à vontade; é só puxar uma cadeira, tomar um suco de umbu e participar enviando comentários e sugestões.  Aproveite!

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